sábado, 5 de novembro de 2011

Quase loucura de amor

Antes de mais nada, eu confesso: eu sou caxias. Sempre fui, desde a mais tenra idade. Sou caxias daquelas que, às vésperas de pedir demissão, liga pra pai de aluno pra avisar que o nêgo não participa das aulas. Daquelas que, às vésperas de dar adeus, marca reforço com aluno. Daquelas que, pouco antes do bye bye so long farewell, faz horas extras em festa de Halloween - e também vai ao reformatório num sábado participar de exposição cultural dos monstrinhos. E, finalmente, daquelas que estava quase perdendo a colação de grau do marido para não faltar em um dia de trabalho.

É, sou caxias grau 10. A coisa é séria. As pessoas me chamam de responsável, eu acho que sou meio sem limites.

Pois bem. Meu marido demorou 7 anos para se graduar em Turismo na UFF, em Niterói. Ele trancou matrícula inúmeras vezes e levou tudo meio daquele jeito. Quando estava fazendo a monografia, quase desistiu. E aí eu entrei em ação. Eu, professora e caxias. Pensem. A conclusão é que passamos noites em claro juntos, ele escrevendo e eu revisando e dando apoio moral na forma de Red Bull, café, coca-cola e cronogramas colados na parede da sala.


A monografia saiu. Ele tirou nota muito boa. Marcaram a data da colação de grau: uma quinta-feira, às 6 da tarde. Minha primeira reação foi: não posso ir. Minha segunda, terceira e quarta reações foram essa mesma: não posso ir. Não queria pedir dispensa porque minha gerente surtaria e eu acabaria por pedir demissão antes do tempo, algo que não posso fazer - por questões financeiras. Chegou a véspera dele viajar e eu chorava. Fui trabalhar e passei o dia macambúzia. Não tinha mais jeito. No dia seguinte seria feriado e logo depois o dia da colação.

Conversei com duas colegas de trabalho e elas foram unânimes: você vai se arrepender. VÁ. Começou a me dar aquele comichão. Eu não poderia pedir dispensa àquela altura do campeonato porque isso geraria uma guerra. Teria que inventar uma desculpa, das boas. EU, que sou caxias e não sei mentir. Só defeitos. Eu posso até mentir mas me sinto tão culpada depois que deusolivre, fica muito difícil.

Pensei, pensei, pensei. Adiantei o que pude para as aulas de quinta, caso eu resolvesse ir. Pensei em alguma desculpa. Todas as histórias eram muito mirabolantes. Não ia rolar. E eu não conseguiria conversar cara-a-cara com a gerente porque ela ia surtar e eu ia jogar tudo pro alto. Voltei pra São Paulo (trabalho em outro município) conversando com minha colega. E ela lá, falando que eu sou besta. E que devia ir. Liguei pruma amiga. E ela lá, falando que sou besta, que devia ir. Porque é a minha vida e emprego a gente arruma outro. E essa formatura era muito importante e eu não podia deixar de estar ao lado do meu marido. Falei com outra amiga e ela lá, falando que sou besta e que o amor é que importa e que eu devia ir.

AI MEU DEUS.

Liguei na escola e falei com o chefe da secretaria. Fui breve: problema com a família do meu marido e eu teria que ir pro Rio de última hora. Agora só faltava a passagem. Ia tentar avião só por desencargo de consciência porque não daria certo mesmo, estaria muito caro, mimimi. Desci do ônibus em frente a uma loja da Gol. Entrei louca: "moça, vou fazer uma loucura de amor, me consegue passagem em conta pra HOJE pro Rio de Janeiro". A atendente adorou. E me achou passagem pra dali uma hora e meia por 65 dilmas.

OLHA O UNIVERSO CONSPIRANDO, gente.

Correria, fiz a mala em 10 minutos, levei mais uns 5 explicando ao meu marido estupefato que sim, eu iria. Vou faltar no trabalho. E minha prioridade é minha família. Meu amor. Ai, que bichinha. Cheguei no Santos Dumont quase junto com meu marido. E quando ele disse "que bom que você veio" e me deu um abraço, tudo fez sentido.

Em outras palavras:

MELHOR DECISÃO dos últimos tempos. Que bom que tive grilos falantes me aconselhando a ir. Que bom. Voltei a trabalhar ontem, foi tudo bem, a gerente não falou nada, não perguntou nada, não quis saber. Eu agradeci aos céus por isso. Que bom que eu contei uma mentirinha em nome de algo maior. Revi meus cunhados, sogro, sogra e avó fofa do meu marido. E foi tudo tão bom!

Moral da história: tudo vale a pena se a alma não é pequena. BRINKS. A moral é que emprego nenhum está acima de estar ao lado de quem se ama num momento importante. Ai, que bichinha².


(de beca e All Star, é assim que se faz!)