quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Não tire esses óculos! Use e abuse dos óculos! - ou - Mrs. Magoo Chu

(não, o da direita não sou eu, era meu professor de Física. Eu sou a ternurinha do meio)

Há quase 12 anos, direto do túnel do tempo...


Ele: Eu NUNCA vou ficar com você, sua baiaca quatro olhos.

Eu: Mas... Mas... Eu tenho olhos verdes...

Ele: Foda-se porque nem dá pra ver seus olhos direito escondidos atrás desse bagulho fundo de garrafa na sua cara. Sério, ogra, você é muito feia.

É assim que traumas se instalam. Também é assim que pessoas muito tímidas e quietinhas e aparentemente inofensivas saem atirando em coleguinhas de escola. Eu não saí atirando e não me tornei uma psicopata, mas obviamente criei traumas. E é aquela velha história: a auto-imagem criada na adolescência segue com você o resto da vida. E você pode fazer terapia (não foi meu caso); pode, de certa maneira, se vingar de todos os garotos recém púberes e cruéis que te dão apelidos carinhosos como "Somália" ou "Ogra da Etiópia" (meu caso), pode se tornar uma pessoa que convive em sociedade e depois de anos resgata a auto-estima perdida em algum lugar recôndito do passado (meu caso, novamente). Mas os trauminhas ficam guardados, bem guardados. E vez ou outra eles voltam à tona.

Eu tenho pavor de gente que vive do passado e vive a repetir sempre as mesmas histórias sobre essa ou aquela pessoa que blablabla whiskas sachê - trauminha de adolescência todo mundo tem e os meus não são piores ou mais horripilantes que de ninguém. No entanto, quem teve um G. na vida fodendo o seu juízo, jamais esquece. É como o primeiro sutiã, só que de uma maneira bem negativa. Eu nem me lembro do meu primeiro sutiã, mas me lembro bem de G. tirando sarro da minha falta de atrativos e inabilidade social e os "amigos" do bairro rindo. E eu, idiota, chorando. Triste, mas passou. Aposto que hoje em dia G. está barrigudo, casado, calvo, broxa e rodeado de filhos remelentinhos. Ao menos é isso que eu desejo pra ele.

Só que o trauma dos óculos, esse não passou não. Foi o que eu disse no primeiro parágrafo: algumas coisas ficam escondidinhas e voltam vez ou outra pra fazer você se foder. Ou melhor, refletir. Eu comecei a usar lentes de contato aos 19 anos. Tenho graus altos de miopia, mais astigmatismo. Sem lentes eu fico muito Mr. Magoo. MUITO. Vejo vultos mas não distingo expressões nos vultos. Se eu estiver sem lentes pode fazer helicóptero com seu pinto na minha frente que eu não vou ver direito. Eu tenho óculos, mas é bastante incômodo usá-los, não somente pelo trauminha, mas por causa do grau alto. Eu não me acostumo, tenho tontura, dor de cabeça, tropeço na rua. Ridícula.

Aí sábado eu cheguei de madrugada, morta de sono e fiz o que nunca fiz em 10 anos de lente de contato: deixei cair no chão e nem vi. De manhã, andando às cegas pelo quarto, piso em algo e ouço um leve CREC. Era a pobre lente, ressecada e agora em pedacinhos. Panic on the streets of London. Como eu faria para sair naquele dia? E para dar aula no dia seguinte? Juro que tentei usar os óculos, mas é impossível: me causa efeitos colaterais físicos e psicológicos. Fui ao shopping aqui perto e voltei logo em seguida. Cancelei as aulas da manhã da segunda-feira e dei graças aos céus por não ter marcado nada com o meu moçoilo - porque eu desmarcaria, com certeza.

No dia seguinte fui cedíssimo pra oftalmologista e consegui uma lente emprestada - poderia, enfim, voltar ao convívio social. Mas fiquei bastante passada comigo, que sou toda cheia de coragem pra tanta coisa, mas não consegui algo muito simples: encontrar com amigos e dar aula usando óculos. É completamente ridículo da minha parte. Absurdo, até. Mas sinceramente, eu já tive que lidar com coisas tão grandes e absurdas esse ano, que esse absurdinho eu deixei passar. Faço terapia ano que vem pra resolver meu trauma de ser vista em público usando óculos. Posso culpar G., claro. Mas, sinceramente, eu tenho uma grande responsabilidade nisso. Primeiro, por nunca ter cuspido na cara do infeliz. Ou ter dado um chute no seu saco. E segundo, por ainda deixar que esses fantasmas imbecis vez ou outra ainda me assombrem. Eu realmente detesto esse tipo de fraqueza.

E quem disse que viver é fácil, não é mesmo, minha gente?

11 comentários:

Patricia Scarpin disse...

Ah, nem fale. Old habits die hard, you know. Por mais que a gente se sinta muito mais poderosa e linda e tal, sempre lembra daquelas merdas que ouviu na adolescência.
O bacana é saber que algumas coisas que nos tornavam miserable são possíveis de serem consertadas - no seu caso, trocar os óculos pelas lentes. Para outras pessoas, perder peso, dar um jeito no cabelo, etc.

Srta.T disse...

Ih, eu também sofria. Lagarixa, barata descascada, juba de leão... a diferença é que eu descia o sarrafo, batia MESMO nos meninos que me davam apelidos. De ir pra diretoria e tudo. E acho que seria muito saudável descobrir onde esse babaca se enfiou e aparecer em todo o seu esplendor na frente dele e ver o cara derrotado, barrigudo e pobre. (careca não, eu tenho apreço pelos carecas)

Andrea Mentor disse...

Chu de Deus! Cada um sabe a delícia e a dor de ser quem se é. Algumas coisas são bem difíceis e, por mais que o passado deve ficar no lugar dele, no passado, elas aparecem pra atormentar. E atormentam. Nada é tão difícil do que tentar digerir mil vezes a mesma história. Mas talvez seja essa a maneira da gente lidar com as coisas. Tomara que sempre que vc lembrar dessas coisas, vc ria muito da cara do G que, na minha opinião, só ser broxa é bom o suficiente. Aliás, ele deve ser impotente desde menino e, para que isso não o atormentasse, resolveu atormentar vc. Troxa! E broxa, não esqueça. Lente salva a pele. Mas, quer saver, óculos muitas vezes é bem charmoso. Mas bom mesmo é poder ser vc, aceitar suas dificuldades e limitações (fisicas e psiquicas) com mta tranquilidade, o que te proporciona postar no blog e nos permitir ler um texto tão bom... Beijo

Carolina disse...

Oi Chu, sempre venho aqui e nunca comento, mas hoje né, não teve jeito porque eu também compartilho do teu drama: tenha váááários graus de miopia e não saio na rua de óculos nem a pau. Lendo teu post me lembrei de uma vez, ainda adolescente e recém saída dos óculos (uso lente desde os 11) que também deixei uma lente ressecar e quebrar JUSTO NO DIA QUE TINHA UMA FESTA! Como lentes de graus altos nunca têm pronta entrega (ainda mais naquela época) não tive a menor dúvida: fui pra festa enxergando de um olho só!
:D
(Adoro teu blog!)

Carol disse...

Adolescentes do sexo masculinos são sádicos. Só pode.
Quando eu tinha lá meus 16 anos escutei de um deles, assim, na minha lata:

- CAAAAAAAAAAAAAAAAARA, VC É MUUUUITO FEIA.

Com uma boca enooooorme e em pleno ônibus do passeio escolar, voltando do fiasco da beinal do livro, com todos os meus amiguinhos de turma apontando pra mim e rindo. Quis morrer.

Faço analise ja ha um boooom tempo, certamente esta etapa já passei... Mas me custou uma nota! hahaha. E tipo, hoje eu nem me acho a última cocada mole da Bahia. Me acho uma mulher normal. Só. :~

Beijo

(ah, sim! To assinando assim estranho pq eu não quero ser descoberta, mas pra vc eu me revelo: sou eu, Carol, do Rio... hehehe. Beijo, gata!)

Carol disse...

To com blog, a proposito!
www.filigranademm.blogspot.com

Beeeeijo

fl disse...

Sei não, mas acho que a terapia vai te ajudar a perceber que essas coisas tão longe de serem "algo muito simples" ou "absurdinho". Mas o que vc escreveu logo depois (sobre sua responsabilidade e sobre o chute no saco do G - que, diga-se, do famoso ponto parece não ter nada...)mostra que essa análise não vai precisar durar muito não...

Unknown disse...

Coincidência ou não, pensava hoje sobre essas coisas do passado que nos assombram! Foi bacana ler teu texto... Aliás, aproveito a oportunidade para te parabenizar pelo blog. Venho sempre ler... é muito bom!! Bom fim de semana pra vc!

Bibi Amaral disse...

Oieee... gostei do blog...

Eu tinha trauma por causa do meu cabelo cacheado, era o ó, e sim eu tinha sotaque de quem morava no TO e estava no RS, era um sarro e eu nem abria a boca na escola. E pra priora minha vida eu era mais alta que todo mundo e pra piorar mais ainda eu era gordinha!!

O que me consola é que alugmas pessoas estao velhas, gordas, carecas... e eu tô feliz, contente, bem mais magra, adoro minha juba....hehehehe.

Quem vai ao terapeuta hj em dia... sao eles, nao eu!

Camila disse...

Patrícia, eu tive que engordar 10 quilos, dar um jeito no cabelo, colocar lentes e passar anos numa auto-terapia intensa para conseguir melhorar como um todo, haha.

Srta. T, minha ídola! Você batia nos meninos? SENSACIONAL. Eu juro que às vezes queria voltar no tempo e bater em meia dúzia de gentes. E olha a ironia. Te chamavam de barata e lagartixa, mas aposto que hoje em dia você tem a pele mais linda que todos eles.

Andrea, que bom que você gostou do texto! :-)

Carolina, você foi brava guerreira, hein. Ir à festa enxergando de um olho só é coisa para os bravos!

Mademuasele (haha), que booom um comentário seu! Já li um pouco de seu blog, vou linká-lo aqui!

Caroline, obrigada!

Doce Pimenta, eu penso a mesma coisa a respeito de algumas pessoas do passado. Tô aqui BUNITA (e modesta) e elas/eles estão mal-acabados e sem graça alguma. RÁ!

Anônimo disse...

Eu jogava bola com os meninos, então a gente se dava bem. Mas as meninas... "Esta bermuda que você está usando... é do teu irmão?" "Credo, você parece um piá." "É melhor usar boné mesmo pra esconde teu cabelo poinhoinhoim."

Opa, que alegria! Ainda bem que eu cresci e não frequento os bares com decoração de bambu, então, out of my life bitches.