quarta-feira, 27 de abril de 2011

Pertencer e ser único

Nós, seres humanos, somos todos muito contraditórios. Sempre. Começamos, desde muito cedo, a querer pertencer - e lá estamos nós, no maternal, buscando amiguinhos que também fazem castelo de areia e depois derrubam tudo imitando um furacão. Os colegas que fazem castelo de areia e não destroem nada imitando furacão não são tão legais. E aqueles que jogam um baldinho de água na bela construção fingindo que é maremoto, putz, esses aí são mesmo uns chatos.

Crescemos e continuamos querendo pertencer. Se isso não fosse verdade, adolescentes não seriam todos iguais e a pressão da turma não poderia ser responsabilizada por tantas babaquices feitas. Buscamos popularidade, nem sempre a conseguimos. Mas há sempre uma turma, por mais torta que seja, pronta pra nos receber. E aí podemos nos contentar com o prêmio de consolação de sermos populares dentro daquele pequeno grupo de pessoas estranhas. Às vezes qualquer similaridade serve. "Nossa, você bebe água depois de escovar os dentes? EU TAMBÉM!". Pronto, formou-se uma aliança. Tornamo-nos adultos e continuamos buscando semelhantes. É extremamente reconfortante estar entre pessoas parecidas - eu sei disso, vocês também sabem disso.

E nem adianta dizer que você é super diferente. Porque corta o cabelo assim ou assado. Porque usa roupa desse ou daquele tipo. O exército de rapazes com camisa xadrez, barba e atitude pseudo-cool que circula ali pela área da Paulista prova exatamente o que estou falando. E é aí que entra a grande contradição. É inerente a todos nós a busca por semelhantes. Ninguém quer ser sozinho. Ninguém quer chamar a atenção por ser o completo oposto da humanidade. Mas, ao mesmo tempo, todos queremos ser únicos. E vemos aquela galera cafona, coxinha, que trabalha em escritório e vai pra "baladinha" e grita "ah uhu, ai ai ai ai ai" e ouve alguma música do U2 e diz pra amiga, com as mãos no coração "UAU ESSA È MINHA MÚSICA". Os caras com copinho de whisky, as meninas todas de saia de cintura alta, regata e batom rosa. E putz, eu não pertenço a essa galera. Eu quero ser diferente dessa galera. Eu SOU diferente dessa galera. Eu sou única.

Aí eu saio desse lugar coxinha e vou pra "náite" da Augusta. Onde todos, supostamente, são cool. Onde o pessoal é "fashion". Eu até posso usar batom rosa, mas meu batom rosa tem atitude. Meu corte de cabelo não é um corte de cabelo, é uma escultura pós-moderna que demonstra toda a minha rebeldia e sede de ser eu mesma. Meus amigos são todos descolados. Aí vem o choque de realidade: seu batom é o mesmo que a menina coxinha do Kiaora usa. Seu corte de cabelo é bizarro, é um Chitãozinho e Xororó piorado. E seus amigos são todos uns metidos que vomitam referências mas, na verdade, são rasos. Eu sou rasa também. E basta você ir a alguma baladinha Vila Olímpia pra ver o quanto ser diferente não é tudo isso. Vão te olhar torto. Vão te chamar de exótica. E você vai querer voltar pro seu reduto, onde todos são parecidos contigo. E se uma patricinha coxa style vai lá pra Augusta, também vão olhar torto pra ela. Vão sim. Porque ela é diferente. Porque, ali, no meio dos pseudo intelectualóides que vomitam referência e sentam na calçada bebendo cerveja, a menina de batom Snob e salto mega alto é diferente. Ali, ela é a única.

E seguimos nessa eterna contradição. Buscamos namorados, namoradas, amigos, amigas, coleguinhas de baia que nos considerem únicos. Porque ao mesmo tempo em que estar cercado de iguais é reconfortante, se saber única aos olhos dos outros é especial.

Eu acho legal ser diferente. No meio da galera coxa eu sou mesmo diferente. Mas ali na baladinha rock eu sou mais uma. Essa é a verdade. Eu também quero pertencer, assim como você também quer. Perceber isso é um alívio, sabem. Porque você para de agir de maneira babaca tentando provar que você pensa diferente, age diferente, suas roupas são diferentes e putz, você frequenta os lugares mais variados e tudo bem. Eu frequento lugares variados e tenho amigos bem variados. Isso me encaixa exatamente no mesmo grupo de pessoas que pensa parecido comigo.

Essa é a realidade: buscamos ser diferentes, mas estamos sempre entre iguais.

4 comentários:

Ge disse...

e não é libertadora essa descoberta?

Fabi disse...

putz, adorei o texto. muito simples, muito claro, muito verdadeiro, muito bom.

Kel disse...

Putz, pura verdade...
A gnt sempre quer ser diferente mas anda com um monte de gente igual...

paula disse...

a verdade mais reconfortante que existe é exatamente essa: quanto mais nos esforçamos em ser diferentes de tudo, mais nos vemos parecidos com tantos outros... nascemos pra viver em sociedade. isso está mais do que provado. e quer a gente aceite ou não, necessitamos da aprovação do próximo, seja lá ele quem for. então sempre encontraremos alguém parecido para ser nossa referência do que queremos e outro pra ser nossa referência do que não queremos. e ponto final.

adorei seu texto!
=)