terça-feira, 4 de dezembro de 2007

15 anos

Quando eu estava no primeiro ano do magistério, tinha essa menina de 14 anos mas parecia ter 20. Ela era alta, bem fornida e muito brava. Ela não aceitava que você dissesse que não gostava das mesmas coisas que ela, porque as coisas das quais ela gostava eram quase sagradas. Ela gostava do Mickey, idolatrava o Palmeiras, usava adjetivos que normalmente são usados para descrever comida ou superfícies transparentes (crocante e cristalino) e amava o professor de História. Na cabeça dela, se ela gostava do Mickey, do Palmeiras e do professor Cristalino, todos tinham que gostar deles também. E, vocês sabem, aos 14, 15 anos, sua cabeça ainda tem muitos espaços vazios que podem ser preenchidos com idiotices alheias. Resultado: mais da metade da turma falava do Mickey e do professor - que era um ótimo professor, por sinal, um dos melhores que eu tive. Mas ele era feio DEMAIS. Cara de areia mijada, rosto vermelho. Não tinha nada que justificasse aquele furor uterino adolescente.

Eu era bem quieta e bem "na minha". A única coisa que fazia com que eu me exaltasse, naquela época, eram os trabalhos e provas e seminários. Eu era muito, muito nerd e compensava minha inabilidade social com as minhas notas. No último ano do magistério eu já estava um relaxo, mas no primeiro, eu era insuportavelmente CDF. Eu nunca quis gostar do Mickey e nem do Palmeiras. Eu me dava muito bem com o professor Cristalino, mas porque eu era uma boa aluna que fazia todos os trabalhos e professores geralmente gostam de alunos interessados. Um dia, o Cristalino falou pra classe toda que eu era a melhor aluna dos primeiros anos. Eu morri de vergonha, as pessoas me chamaram de CDF e tudo teria acabado aí, não fosse o fato da tal menina bem fornida ter ficado com raivinha. Foi aí que eu vi que ela não era nada esperta: se ela queria a atenção do Cristalino, era só fazer os trabalhos. Simples assim. Além do mais, ele era gay, então nem adiantava querer chamar a atenção dele com a sua bunda enorme. Pra ele a bunda enorme da menina era, sei lá, invisível.

Depois, ela caiu pra fazer um trabalho comigo e não fez nada. Eu estava meio cansada de carregar grupos nas costas, porque eu era idiota e fazia os trabalhos e as pessoas ganhavam nota com o que eu havia feito. Aí resolvi ser escrota: na avaliação do grupo, eu falei pra professora de Geografia que eu havia feito tudo sozinha. Ou seja, eu fodi com a nota da menina bunduda. Ela me odiou, muito, é lógico. Uma baixinha semi raquítica, com óculos fundo de garrafa e inabilidade social, foder com a nota dela? Eu até entendo o ódio. E acho que fui escrota. Mas naquela época eu nem pensei nisso, não tive tempo: a menina começou a ameaçar de me bater. Ela tem 1,80, eu tinha 1,54 na época. 1,54 e 39 quilos. Percebam: eu era MUITO PEQUENA. Tive medo da bunduda, mas depois a raiva dela passou e tudo ficou bem. Mas tudo ficou bem só depois da metade do segundo ano. Até lá, se eu entrasse na sala dela (no segundo ano mudamos de turma), ela começava a falar alto "o que essa magrela insuportável tá fazendo aqui??? Vou tirar essa menina à força". Eu tinha medo dela realmente me bater. E esse foi meu episódio de BULLYING.

Mais de dez anos depois, vem o orkut. E a menina me acha no orkut. A turma do magistério marca um reencontro e eu vou. Lá, a bully girl diz que aquilo são águas passadas e que ela mudou e que nossa, que vergonha ela ter me ameaçado daquele jeito. Esses reencontros são patéticos, mas servem pra você ver que as coisas passam e você muda, e puxa, mudar faz parte do crescimento. Só que vendo o orkut da Cristalina eu vejo que ela continua idolatrando o Mickey, continua usando o adjetivo "cristalino", continua com fanatismos (agora, além do Palmeiras, tem o Charlie Brown Jr - porque Chorão é poeta, vocês sabem. E ela diexa claro no perfil que você não é autorizado a falar mal de Charlie Brown. AME-OS. AGORA). Ela continua achando que é linda (auto-estima é muito importante) e continua usando frases estúpidas do tipo "não gostou de mim? eu não me importo, você não é nada, eu me basto". Sabem, ela tem 29 anos. Charlie Brown Jr e frases de miguxa. Não dá.

Eu tenho essa sensação de que as pessoas pararam no tempo sempre que reencontro alguém das antigas. Parece que as pessoas se congelaram ali, nos idos dos anos 90, e fazem as mesmas coisas, gostam das mesmas coisas. Eu mudei muito nesse tempo. Dos 15 aos 28, é água DEMAIS passando embaixo da ponte. Não freqüento os mesmos lugares de quando tinha 20 anos, não ouço a mesma música que ouvia aos 15. E acho normal. Essa coisa de mudar. É normal. É amadurecimento. Por que, então, as pessoas gostam TANTO de serem as mesmas, negando a ordem natural das coisas? Ninguém aprende com a vida, não?

Eu, hein.

12 comentários:

Anônimo disse...

Isso nao passa de um truque muito antigo: se voce sempre fizer as mesmas coisas, o tempo nao passa. Mesmo. O relogio para e tudo mais, eternamente jovem.

Patricia Scarpin disse...

Essa de ser ameaçada com porrada acontecia comigo direto (também fiz magistério, mas larguei no último ano pra fazer faculdade). Porque eu era baixinha, minúscula, CDF pra cara... e os professores me adoravam. You do the math - mais ou menos como vc. ;)
Engraçado era que as meninas não ameaçavam ninguém do tamanho delas. Super corajosas, né?

Fico tão feliz quando vejo que estou anos-luz daquilo tudo. Mas tem gente que só tem aquilo, se agarra com unhas e dentes...

Loo disse...

é como eu digo: até cancer se desenvolve ...

/escrota>

Anônimo disse...

Por isso que não faço a menor questão de reencontrar pessoas que não vejo há mais de uma década. As que eu reencontrei me decepcionei por conta desse lance delas não terem "evoluído" enquanto seres humanos dotados de polegar opositor. Mas eu também até entendo que algumas não mudem. O meio q essas pessoas vivem contribui bastante pra isso. A gente conseguiu enxergar um mundo maior, mas esse povo não. Acho que aí que está a diferença...

Beijos!

Marie* disse...

chorão é poeta...kkkkkkkkk
G-zuis!!! onde esse mundo vai parar!
to começando entrar nessa fase de se decepcionar pq o povo não vai para frente...

A. F. disse...

É por isso que eu A-M-O encntrar pessoas dos tempos da escola. Uma forma bem simples e efciente de dar um afago no ego.

Srta.T disse...

Ai chu, siacabei de rir da sua descrição da menina. O meu desafeto maior foi na faculdade, em circunstâncias corporeamente parecidas, vindo da "Travecosa". Quase que ela afunda a minha cara, hehehehehe.

Camila disse...

Anônimo, faz bastante sentido isso que você disse... Mas, quem és tu?

Patrícia, poi zé, vinham querer bater justamente nas nerds. Tem cabimento?

Earl, hahahahahahahaha

cris, eu também não sou chegada em reencontros de colégio. Quer dizer, já tive minha fase, em que adorava. Mas hoje em dia eu morro de pregs.

Marie, Chorão é emoção, né?

Amber, essa parte do ego é verdade. É um afago e tanto. Mas, ao menos pra mim, dá preguicinha hoje em dia...

Palita, imaginei uma trava montada tentando afundar a sua cara. Hahahaha!

S. disse...

Sou a leitora anonima e randomica de Sudbury. Nao costumo botar meu nome porque nao conheco ninguem mesmo, e o meu blog pessoal e' mais pra minha mae poder ver o que eu to fazendo aqui longe do que pra qualquer outra coisa. Mas fica o link, ja' que voce perguntou quem eu era!

Renata disse...

Lembrei de Friends, quando a Monica vai sair com o cara mais popular da escola e ele continuava sendo o cara mais popular da escola. morando com a mãe e no mesmo emprego, inclusive.

Kelli Machado disse...

Tenho uma "amiga" que é assim, parou no tempo... incrivel... chego a ficar com dó quando recebo emails com os mesmos blablabla e choramingações... eu mudei tanto, vivi tantas coisas e tenho tantos planos novos e, ela, continua fazendo cursinho pq *esse ano* vai prestar o vestibular para o curso X e aí sim será feliz. Triste. Muito triste...

Lacerad disse...

"Cara de areia mijada, rosto vermelho. Não tinha nada que justificasse aquele furor uterino adolescente."

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA